20070307 |
carta. (III) "para: ti.
rabiscado na parede, ao lado de outros 2 gatafunhos.meu amor, quando leres isto, não sei onde estarei. não sei se estarei aqui, não sei se já terei entrado no vale das sombras donde ninguém retorna. no entanto, senti à mesma necessidade de te escrever, senti necessidade de tentar, nem que fosse duma maneira muito irreal, estar em contacto contigo, dar-te algo meu, uma notícia, um sorriso, sei lá... algo que possas dizer que é meu e que é uma oferta de mim para ti. por isso esta missiva. que tenho para te dizer? nada mudou desde a última carta, creio. voltaste, mas continuas longínqua demais, demasiado longe do meu alcance, demasiado longe para que me possas dar o beijo da vida e me inundes de querer e esperança... tenho vivido os últimos tempos a um canto, na escuridão, não por tua culpa - não tens culpa de ter sido preso aqui -, mas a verdade é que a solidão tem sido uma parte integrante da minha vida, uma companheira que me tem acompanhado durante todos os últimos tempos. uma companheira indesejável, mas uma companheira, de qualquer modo... porque mais ninguém se chega. tu não podes, infelizmente... gostava de te poder dizer muita coisa. coisas que nem eu próprio sei. gostava de te dizer que quero a meu lado eternamente, que quero como minha esposa e mulher, que quero que carregues a minha descendência e sejas a mãe deles. gostava de to dizer. mas não sei se teremos essa oportunidade, porque não sei se alguma vez conseguirei sair daqui. se alguma vez terei a liberdade que necessito para fazer o que ambiciono, o que quero e o que desejo... és uma luz e um raio de sol na minha vida, algo a que me agarro desesperadamente quando as coisas parecem realmente não poder piorar mais... e o que me mantém ainda vivo no fim da noite, quando me deito no meu colchão e tento concíliar o sono, é saber que falta menos um dia para poder estar contigo. porém, o que acontece muitas vezes é que acabo por me aperceber que acabei de passar mais um dia sem ti. e choro, muitas vezes. choro por ter uma ferida invisível, que não sara nem há maneira de curar. choro porque não sei o que se passa. choro porque não sei que raio fiz eu para merecer este castigo... sinto-me como prometeu, sendo esventrado todos os dias por uma águia; a única diferença é que eu não vejo a águia. e eu não fiz mal nenhum a ninguém. então porque sou eu atormentado assim? será por apenas existir? será por ter nascido? mas a quem ofenderia eu com tal acto do qual eu sou o menos responsável? desculpa, meu amor, se te soterro com todo este palavreado sem sentido. é para te aperceberes um pouco como se passam os meus dias. a falar. a falar com quem me prendeu. a falar com... quem? não sei. falo aos quatro ventos, para ninguém, como se tivesse à frente os meus captores. nada mais tenho para fazer, senão falar. o tempo passa muito lentamente, quando se está só e abandonado, na escuridão e ao frio. não, princesa, a culpa não é tua, mais uma vez. não foste tu que me fechaste aqui. mas quem sabe... até podes ser tu a tirar-me daqui para fora. talvez sejas tu a deter em tua posse a chave que me poderá dar a tão ansiada liberdade. tenho confiança em ti. esperança, mesmo. talvez esteja a perder a razão. não sei, tu serás a júri dessa questão, ao passares os olhos pelas linhas que te escrevi. eu não sei e não me interessa, para ser franco. perdi muito do que era, antes, já não me importo com o que sou, agora. eu sou o que sou, e ninguém o poderá mudar. talvez tu possas. como disse antes, tu poderás ter a chave. tu poderás ser a chave. não me vou alongar mais, até porque não gosto de te massacrar com as minhas balbúcias. sê feliz, amor meu. e salva-me, se o conseguires. tira-me daqui. eternamente teu, aquele que já não sabe quem é" |
20070306 |
desorientado. vivo numa prisão. uma prisão sem barras ou cadeados, uma prisão sem guardas ou regras. cumpro uma pena sem saber porquê, sem saber quem me condenou, sem saber quem me acusou. vivo numa prisão, mas uma prisão que não é real. ou é só para mim, já nem sei. vivo... já nem sei se vivo. ao passar os dias cada vez mais me convenço de que já não vivo, apenas respiro e ocupo um lugar predestinado a alguém com mais possibilidades de sobrevivência...
rabiscado na parede, ao lado de outros 0 gatafunhos.o que quero eu? o que ambiciono? gostava de, ambicionava poder sair daqui, mas o problema é não saber o que é "aqui", onde é "aqui"... encontro-me perdido na incerteza e na dúvida, tendo como companheiras a escuridão e a nostalgia. quero fugir e não posso, quero correr, saltar, esconder-me, ser um prisioneiro em fuga, inconformar-me, rebelar-me... mas rebelar-me contra o quê? que colete de forças é este em que estou enfiado, em que fui enfiado? como posso eu escapar-me a algo que nem sequer consigo definir? como conseguir o que quero se nem forças tenho para saber quem sou eu? "tic, tac, tic, tac..." o tempo não é bom conselheiro. |
companheiros de cela.
apenas o meu encarcerador
créditos.
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parede.
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